Apresentaremos aqui a história de uma entidade que sempre lutou pelos direitos da categoria petroleira no Ceará. A vida do Sindipetro Ce/Pi está fortemente imbricada com a realidade política, social e econômica do país por se tratar de um trabalho que envolve um setor estratégico para a soberania nacional. O movimento sindical petroleiro e a história do Brasil vão se confundir várias vezes, deixando claras as consequências desse diálogo em diversas situações. Saiba um pouco mais sobre o surgimento e os principais acontecimentos relacionados a esse braço constantemente erguido em defesa do trabalhador.

A Aspetro: fundada em meio ao golpe de 1964

A história do sindicalismo petroleiro cearense tem como marco inicial a criação da Associação Profissional dos Trabalhadores na Indústria de Destilação e Refinação de Petróleo do Estado do Ceará (Aspetro), embrião do futuro Sindipetro Ce/Pi. Fundada em janeiro de 1964, a ASPETRO funcionava nas dependências da própria Petrobras, onde recebia seus documentos e suas correspondências. A própria composição da diretoria refletia a ligação umbilical da direção da empresa com a Associação.

Existiam somente cerca de 40 pessoas na empresa. Os demais eram trabalhadores de empreiteiras contratadas para auxiliar na construção da fábrica. Antônio Heráclio do Carmo, primeiro presidente do Sindipetro-CE, foi eleito por aclamação e empossado em fevereiro de 1964. Logo depois, em 1º de abril, o Brasil viveria a realidade do golpe militar. Heráclio recorda que, no mesmo dia, o secretário-geral da Associação, Osmar Antônio dos Santos, lhe ligaria pedindo para queimar documentos que existiam no GIFAN/SEFOR (Grupo de Instalação Fábrica de Asfalto do Nordeste/Setor Fortaleza).

Em maio de 1966, foi empossada a segunda diretoria da Aspetro. Na mesa composta para dar posse ao novo presidente, José Maria de Almeida, se destacavam os companheiros Valente, Celso Garcia e o ex-deputado federal pelo PCdoB Sérgio Miranda (1947-2012), à época representante estudantil pelo Diretório Central Estudandil da Universidade Federal do Ceará (DCE – UFC).

Naquele momento foi criada a Federação Nacional dos Trabalhadores na Indústria de Petróleo, que iria originar a Federação Nacional dos Petroleiros – FENAPE. A Aspetro tinha seu boletim mensal, precursor do nosso Rádio Pião: o Informativo ASPETRO.

O golpe militar iria impor severas restrições à organização dos trabalhadores. A postura atuante e a organização daquela recém-inaugurada associação chamaram a atenção das “autoridades” da época: “nos acusaram de subversivos e instalaram uma comissão de inquérito, presidida pelo marechal Sucupira, que veio do Rio para nos investigar, mas não encontrou nada”, conta Heráclio do Carmo, que sustenta que “havia elementos infiltrados no meio das entidades”, devido “à quantidade de informações que os militares conseguiam sobre nossas atividades”.

Havia porém um paradoxo na caserna, já que a campanha do “petróleo é nosso” teve o apoio decisivo do Clube Militar – onde destacavam-se entre outros, o pai do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, Leônidas Cardoso. Havia outra linha, da UDN (União Democrática Nacional), que era anticomunista e vendida ao capital estrangeiro. Na época, a liberdade sindical não existia. A repressão local aos sindicatos era articulada pela Delegacia Regional do Trabalho (DRT).

Após o traumatizante inquérito, e com o país sendo sacudido por uma acirrada campanha anticomunista, a ASPETRO funcionou, até 1974, como uma entidade meramente recreativa. Naquele ano, o penúltimo presidente da Associação, Luís Gonzaga da Silva Neto, terminou o mandato e não tinha sucessor. “Ninguém queria assumir, e ele estava decidido a entregar a chave à DRT”, lembra Heráclio, “alguns companheiros então me pediram para realizar esta tarefa, acabei aceitando, porém com o único objetivo de transformar a Associação em Sindicato”.
Nasce o Sindipetro, entidade em luta contra a ditadura militar

No dia 23 de abril de 1973, nascia um novo sindicato no Estado do Ceará: o Sindipetro, egresso da ex-associação dos petroleiros. À frente dos destinos da entidade, o primeiro presidente, Antônio Heráclio do Carmo.

A burocracia foi toda cumprida: criou-se um estatuto, a documentação foi enviada ao Ministério do Trabalho (MTb) e a carta de sindicalização chegou cerca de quatro meses depois, em meados de 74. “Com meu objetivo cumprido, pensei em sair de cena, mas novamente meus companheiros me convenceram a continuar, até porque era difícil formar uma chapa, por conta da repressão”, conta Heráclio.

A liberdade sindical não existia. O “estatuto” era padrão, fornecido pelo Ministério do Trabalho com modificações mínimas realizadas através de assembléias, mas que tinham de ter a aprovação da Comissão de Orientação Sindical. A repressão local ao sindicatos era articulada pela DRT, que tinha de ser informada periodicamente sobre todas as atividades das entidades, inclusive prestação de contas e previsão orçamentária.

Heráclio conta que “sempre procurou-se manter a independência, não mandávamos documentos, fazíamos atos sem avisar, forçando a barra devagar”. “As comemorações do 1ª de Maio eram coordenadas pela DRT e, certa vez, fizemos nossas próprias manifestações; fomos chamados pelo próprio delegado, o Neiva de Souza, que ameaçou realizar uma auditoria no sindicato; como éramos muito organizados nesta parte financeira, nunca tivemos o que temer”.

Com uma categoria de apenas 180 pessoas, a entidade, que abrangia somente a base territorial de Fortaleza, tinha 100% de sindicalização. Talvez por isso as relações com as chefias (o superintendente da ASFOR – Fábrica de Asfalto de Fortaleza – era Rui Amauri Freire Castelo, filho do ex-governador cearense Plácido Castelo) eram muito boas. Como lembra Heráclio, “todos eram conhecidos”. A ingerência de partidos políticos na direção da entidade praticamente não existia.
A ditadura aperta o cerco contra os sindicatos, mas o Sindipetro não se entrega

Havia dois diretores do Sindipetro liberados (Heráclio – presidente – e José Weber – secretário -, auxiliados pelo tesoureiro Ananias Marques da Costa), e o sindicato era filiado à Federação das Indústrias do Estado do Ceará, uma entidade tão pelega que o seu presidente José Moreira Leitão, colocava um gravador na mesa em todas as reuniões para repassar informações para a DRT, explica Heráclio. Não havia meios alternativos de comunicação com a base, a não ser as assembléias, que sempre eram realizadas na sede com presença da categoria.

Não existia uma federação específica dos petroleiros, apesar desta ser uma posição sempre defendida pelo Ceará, que não ia à frente por que o governo não permitia e também por questões de bairrismo, testemunha Heráclio. Quando aproximava-se a data-base – que sempre foi em 1º de setembro – havia um Encontro Nacional dos Diretores Sindicais, que mudava de lugar todo ano, e que reunia 13 sindicatos.

Quando íamos negociar, atestávamos que a direção da empresa já sabia de todas as nossas discussões, denuncia Heráclio. Geralmente, por causa dos poucos recursos, os representantes do Ceará tinham suas passagens pagas por rateio com os outros sindicatos.

Apesar da repressão, pelo menos uma coisa aquela época superava a atual: não se falava de privatização, até porque, como já foi dito, a maioria dos presidentes da Petrobras eram militares de viés nacionalista. A Petrobras gozava de muito prestígio junto à população, que participou ativamente da luta do Petróleo é Nosso.

De 1968 a 1978, o movimento sindical estava numa fase tímida, por conta da intensa repressão da ditadura militar. Um decreto do então Ministro do Trabalho, Arnaldo Prieto, proibia qualquer reunião intersindical. Os Encontros Nacionais de Dirigentes Sindicais do Petróleo tentavam em vão negociar: o governo só dava o que a lei permitia. Na época, o Sindipetro-CE utilizava os serviços do advogado da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Indústria, Almir Pazzianoto. A efervescência política daqueles anos de chumbo tomou conta da categoria, que passou a participar mais ativamente da vida sindical. Em 1977, a mesma chapa concorreu vitoriosamente às eleições para a segunda gestão do Sindipetro-CE. A realidade mudou no bimestre abril/maio de 1978, no ABC paulista, com greves e agitações, que fizeram o governo recuar. Devido a repercussão, a imprensa teve de cobrir os fatos.

Vários momentos marcaram a luta dos petroleiros, como o enfrentamento direto da repressão quando do apoio – junto com os bancários – a uma greve dos metalúrgicos em plena ditadura. Além disso, o Sindipetro-CE trouxe – novamente em parceria com os bancários – pela primeira vez, o então sindicalista Luís Inácio Lula da Silva ao Ceará.

O 14º Encontro dos Petroleiros, em julho de 78, teve cobertura da revista Veja. No documento elaborado neste encontro, os petroleiros, além das reivindicações da categoria, pediam que as liberdades políticas fossem respeitadas, e que os direitos individuais não fossem pisoteados como vinham sendo ao longo de 14 anos de regime autoritário. Falar em liberdade sindical, direito de greve, anistia e restauração da democracia era quase suicídio naquela época. O pioneirismo deste encontro se deu também pela iniciativa de chamar representantes de outras categorias para trocar experiências. Estiveram presentes, além do ex-ministro do Trabalho Almino Affonso, os futuros adversários Fernando Henrique Cardoso – à época um sociólogo respeitado – e Luís Inácio Lula da Silva, que acabou sendo a maior atração do evento quando afirmou que a luta pela autonomia sindical está intrinsicamente ligada à luta pelo retorno das liberdades democráticas.

Em 1978 foi a primeira vez que a Petrobras negociou desde 1964. Os petroleiros obtiveram algumas conquistas e a imprensa sentiu que a categoria começava a efervescer. Em 1979, deu-se um grande enfrentamento com a repressão: os petroleiros decidiram realizar as festividades do 1º de Maio sem comunicar a DRT, que fiscalizava todas as ações. Jacob Bittar – então presidente do Sindipetro de Campinas – prestigiou o evento. O 1º de Maio unificado reuniu vários sindicatos, como o dos metalúrgicos e o dos bancários. Na oportunidade, Bittar lançou o manifesto para criação do Partido dos Trabalhadores.
Uma entidade se credencia politicamente

No dia 28 de novembro de 1980, José Weber Demétrio da Ponte assumiu a presidência da entidade, juntamente com o secretário José Carlos Santana e o tesoureiro Antônio Heráclio do Carmo. Weber seria presidente do Sindipetro-CE por três gestões consecutivas. As ações do Sindicato, enquanto entidade, começam a ficar mais evidentes, mais por conta da ação da diretoria – em particular do próprio Weber, como se perceberá adiante – do que pela participação da categoria propriamente dita, ainda incipiente e de visão restritamente corporativa.

Naqueles tempos de repressão, foi articulada a Frente Sindical Unificada dos Trabalhadores Rurais e Urbanos do Estado do Ceará. Coordenada por Weber e o jornalista Auto Filho, a Frente juntou o movimento sindical, popular e estudantil. Várias figuras de luta, a maioria do MDB, já participavam destas atividades: Dilmar Miranda, Maria Luiza, Rosa da Fonseca e Inácio Arruda, que era envolvido com associações de moradores. Os jornais da época, principalmente O Estado, que era mais respeitado e tinha uma página dominical sobre sindicalismo (o único jornal onde Auto Filho conseguia emprego, devido à repressão), registra várias atividades da Frente.

A Frente realizava reuniões semanais em locais diferentes, como a Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado do Ceará (Fetraece) e o Sindicato dos Bancários. Eram atos, seminários – houve um, inclusive, sobre a questão da seca no Nordeste – e cursos sobre sindicalismo – onde se mostrava como criar uma entidade, dava-se noções de direitos etc. Graças a este trabalho da Frente, várias oposições se organizaram e tomaram os sindicatos das mãos dos pelegos. Caso dos bancários, eletricitários, comerciários e telefônicos.

Em 1980, a Frente organizou o Encontro Estadual de Trabalhadores Rurais e Urbanos do Estado do Ceará, conseguindo recursos com o então presidente da Assembléia Legislativa, Aquiles Peres Mota. Mais de 100 trabalhadores vieram discutir com sindicalistas de todo o país – como Paulo Scromov – na Porciúncula, um convento. Jacob Bittar veio à Fortaleza novamente, agora como Secretário Nacional do Departamento dos Petroleiros e vários sindicalistas também foram convidados para a posse. No outro dia, representantes de 16 sindicatos foram convocados à DRT para “dar explicações”. O delegado sempre fiscalizou rigidamente as contas do sindicato, mas como o Sindipetro continuava sendo rigoroso nesta parte, nunca houve problema.

Para quem estranha o nome Departamento, cabe uma explicação. Os encontros nacionais não eram reconhecidos pela Petrobras, pois não tinham personalidade jurídica, e a direção da empresa sempre usava este como um dos motivos para não negociar. Tentou-se registrar oficialmente a FENAPE – Federação Nacional dos Petroleiros – em 76, mas o ex-Ministro do Trabalho, Arnaldo Preito, afirmou que isso não seria concedido por questão de segurança nacional. A saída foi criar, em 79, o Departamento Nacional dos Petroleiros e Petroquímicos, ligado à Confederação Nacional da Indústria (CNTI), só para ter amparo legal.

Em 1980, realizou-se também a 1ª Conclat – Conferência Nacional da Classes Trabalhadoras, baseada na brecha deixada pela realização da Conclap – Conferência Nacional das Classes Produtoras, de 79. Em 1983, houve o racha, e duas Conclats foram realizadas, uma dissidência em São Bernardo do Campo, puxada por Lula, que viria gerar a CUT; e uma em Praia Grande, com o Joaquinzão, que tornar-se-ia a CGT, e que aglutinou independentes, MR-8, PCB e PCdoB. No Ceará, com o racha, a Frente teve o princípio do fim.

O último grande ato da Frente foi trazer o Dieese para o Ceará. Walter Barelli, que depois seria ministro do Trabalho na gestão do presidente da República Fernando Henrique Cardoso, era o coordenador nacional. A Frente levou a idéia a vários sindicatos e foram conseguidos recursos. A verba veio do Banco do Nordeste – BNB; também houve ajuda do SINE (antigo Sistema Nacional de Emprego, hoje Instituto de Desenvolvimento do Trabalho – IDT), que cedeu um estagiário; e dos bancários veio o espaço físico. Alberto Teixeira (ex-delegado da DRT no governo Itamar Franco e ex-diretor da Fundação Instituto de Pesquisa e Informação do Ceará – Iplance – e do Instituto de Pesquisas sobre o Desenvolvimento do Estado do Ceará – Inesp) foi o primeiro coordenador estadual.

Em 1983, a efervescência do movimento sindical petroleiro ficou mais evidente. O governo baixou um Decreto-Lei retirando várias conquistas da categoria, como a participação nos lucros, os anuêncios e a periculosidade (menos aos que trabalhavam nas refinarias). Discutiu-se a primeira greve dos petroleiros em plena repressão. A greve iniciou-se em Campinas e na RLAN. Jacob Bittar planejou a greve em Campinas e conseguiu controlar todas as unidades através do Sindicato. Sua estratégia foi exemplar: ele cortou a rendição e, com os trabalhadores esgotados, a empresa foi obrigada a negociar com o sindicato, que acabou por dizer quem trabalhava, quando e aonde. A situação de controle por parte da entidade ficou tão escancarada, que a empresa optou por bancar a parada das unidades. Mas a ação do governo foi truculenta: Sigiaki Ueki (então presidente da Petrobras) e Murilo Macêdo (ministro da Minas e Energia à época) apresentaram uma lista de demissões, o sindicato sofreu intervenção, a diretoria foi cassada e todos foram enquadrados na Lei de Segurança Nacional. O apoio inicial da categoria dissipou-se após 383 demissões sumárias. O departamento teve de ir negociar na residência de Murilo Macêdo, pedindo o fim da intervenção. A derrota foi dura e o movimento desarticulou-se por muito tempo.

Mesmo assim, o país já tinha um outro perfil. O movimento pelas Diretas Já para presidente da República, em 1984, sacudia todo o movimento popular e os petroleiros também participariam efetivamente dessas mobilizações.

A segunda gestão de José Weber também seria responsável pela compra da atual sede do Sindipetro-CE. Ele lembra que antigamente existia uma maior facilidade de negociar cláusulas econômicas: “as empresas tinham mais autonomia para negociar, sem uma ingerência tão grande por parte do governo; os militares nunca falavam em privatização, pelo contrário, era comum, o anúncio da estatização de vários órgãos”. A Petrobras foi a primeira empresa no país a colocar nos seus acordos cláusulas como a proteção no emprego, a jornada de 44 horas semanais, a assistência médica supletiva – extensiva inclusive aos aposentados -, a gratificação de férias integral com todos os adicionais, a complementação do auxílio-doença e a antecipação de 50% do 13º salário em fevereiro, afirma o petroleiro. E complementa: “por causa disso, os petroleiros sempre foram referência para todas as outras categorias do movimento sindical”.

A categoria cresce: redemocratização e influência partidária

Com a instalação do Distrito de Produção da Bacia Potiguar (Diguar), atual UN RN/CE, houve novas filiações. Começou então o crescimento do número de trabalhadores. No Ceará, a grande tarefa passou a ser formar militantes e filiar a categoria ao Sindicato. Havia problema, porém, por conta da divisão da categoria pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que considerava o pessoal da produção, exploração e perfuração um tipo de trabalhador diferente de quem trabalhava na indústria de destilação e refinação de petróleo.

O sindicato só tinha filiados do Depin (Departamento Industrial, todos da Asfor) e do Decom (Departamento Comercial). O pessoal da produção tinha duas opções: ou se filiava ao Sindipetro-CE ou fundava outra entidade. A UN RN/CE estava em processo de crescimento, já que a Petrobras estava recebendo as plataformas das empreiteiras e começava a contratar mais pessoas. Uma Portaria Ministerial permitiu a unificação e, numa reunião com a direção do Sindicato, foi decidida a filiação em massa, até porque não havia sentido haver dois sindicatos com uma base tão pequena. Em 1985, a filiação foi realizada sem obstáculos e a militância aumentou em quantidade e qualidade. A Petrobras, aos poucos, aceitou o desconto em folha para o sindicato.

A força que veio do mar com as novas filiações transformou a vida política do Sindipetro-CE. O crescimento quantitativo foi também político. De 1983 a 1988, o pessoal do serviço de engenharia da Petrobras, contido no Empro, veio para montar as plataformas. A influência partidária começa a ficar evidente na entidade. Alguns dos novos filiados eram filiados ao PCdoB e ao PT. Em 1985, Aloísio Arruda – filiado ao PCdoB – era liberado para o Sindicato pela Delegacia Off-Shore, criada para atender as demandas daquele ramo específico da categoria. Em 1986 seria tesoureiro na direção recém-eleita. Entre os petistas, destaca-se Aíla Maria Silva Magalhães, que veio organizar o Movimento de Oposição Petroleira (MOP), nos anos de 1988 e 1989. Outro então simpatizante do PT, Wanderley Antunes Bezerra, foi eleito delegado sindical off-shore na direção de 1986.

O informativo do Sindipetro-CE, chamado à época de “Refinadas do Rádio Pião”, nasce também em 1986. A investida na comunicação visava quebrar com dois discursos que congelavam a mobilização da categoria. O primeiro dizia que, como a Asfor era deficitária, pois produzia asfalto subsidiado, era um pecado fazer greve. O segundo pregava que, como a base era pequena, uma paralisação nem influía nem contribuía. Isso somado ao medo do regime político e à despolitização, dificultava a ação sindical.

1986 foi marcado pela realização do I Congresso Estadual dos Petroleiros, que por si só é um evento vitorioso, pois é realizado ininterruptamente todos os anos. As conquistas imediatas desta maior organização aparecem já em 1987, foi o restaurante e o ônibus para a base de apoio das plataformas, direitos que a Asfor tinha e a RPNS não. Com o trabalho de sindicalização dos off-shores, o Sindicato havia ganhado vida nova.

Os petroleiros inicialmente se filiaram à CGT, por influência do PCdoB, em 1986. Posteriormente, o Partido Comunista do Brasil optou pela CUT, então braço sindical do PT, e levou o Sindipetro-CE para a nova Central em 1990. A CUT cresceu investindo nas oposições e tomando sindicatos pelegos, até chegar ao que é hoje, a maior central sindical da América Latina.
A greve de 1988: um novo país, um novo sindicalismo

A primeira greve nacional dos petroleiros após o golpe militar seria realizada somente em 1988, logo após a promulgação da Constituição. Havia um sopro de liberdade no Brasil. Para se ter uma idéia, a última greve nacional havia ocorrido em 1961, a greve do “equipara ou aqui pára”, quando o Ceará sequer constava no mapa da produção petrolífera do país.

O estopim foi o reajuste dado aos bancários (26%), em comparação ao da Petrobras (4%). De 11 a 21 de novembro, houve uma greve nacional unificada. O ministro das Minas e Energia era Aureliano Chaves. O então presidente da República, José Sarney, queria os fuzileiros navais nas plataformas e ameaçou usar a Lei de Emergência, chamando reunião até do Conselho de Segurança Nacional. Após a greve, além de um reajuste de 15% e não de 4%, os petroleiros tiveram um avanço político muito grande. Na época, foi uma vitória. O comando de greve, em Brasília, foi todo cercado pela polícia. Mas a categoria resistiu até o fim.

Em novembro de 1988, os petroleiros cearenses fizeram sua primeira greve, em 15 anos de Sindipetro, e se sentiram mais ligados à conjuntura nacional. Às 7 horas da manhã do dia 11 de novembro, os petroleiros do Ceará deram uma demonstração de força surpreendente, numa ousadia sem limites – nas plataformas. A greve de ocupação soava como o desabrochar de uma flor que, com muita energia, enfrentava a batalha por uma vida melhor. Foi um movimento espontâneo, mas organizado. Os trabalhadores eram novos, a maioria, solteiros, com garra e disposição, o que ajudou a configurar um grande movimento. Houve uma crescente união entre o pessoal do Nuproce – mais solto e decidido a realizar o movimento – e os trabalhadores da Asfor.

Tudo foi na base da ousadia, pois não havia experiência acumulada. Organizados na marra. Não havia nem sequer um esquema de comunicação definido. As plataformas foram ocupadas e colocadas barricadas nos helipontos. Com a ameaça dos fuzileiros navais embarcarem, criou-se um código de comunicação pelo rádio: os engenheiros ouviam mas não entendiam. O desembarque foi emocionante. Aloísio Arruda deu entrevista em cadeia nacional de TV anunciando que as plataformas do Ceará estavam ocupadas. Os petroleiros tomaram consciência de uma nova forma de luta. A partir daí, a empresa – que foi apanhada de calças curtas – traçou estratégias que passaram a dificultar nossas ações.

Nesta greve despontaram várias lideranças de base. Antes da greve da categoria, em julho de 1988, cabe o registro da greve de 100% dos trabalhadores terceirizados das plataformas de perfuração da Odebrecht, em junho de 1988. Os grevistas queriam a extensão de benefícios (reajuste salarial, assistência médica e vale-refeição, entre outros). Os trabalhadores procuraram o Sindipetro-CE e sindicalizaram-se. A entidade negociou com a empresa num momento de crise, pois a greve era de ocupação na plataforma (quem estava não desembarcou e quem ia render não embarcou). Mesmo ameaçando demitir quem não voltasse a trabalhar, a Odebrecht foi obrigada a negociar. Os trabalhadores conseguiram a manutenção do pagamento da hospedagem, em Natal, de quem iria embarcar . Além disso, exigiram que a negociação fosse realizada na sede do Sindipetro-CE, o que de fato aconteceu. A empresa aceitou toda a pauta e os diretores Aloísio Arruda e José Weber foram ao Rio de Janeiro assinar o acordo na sede da empresa. Foi um exemplo de luta que não será esquecido. O engajamento dos petroleiros permitiu que se ampliasse a discussão sobre as eleições para o sindicato, que iriam acontecer em 1989.

O Sindipetro-CE foi o primeiro sindicato do Estado a sair do estatuto padrão da CLT. Em 1988, Aloísio Arruda, José Weber e Wanderley Antunes formavam uma comissão para elaborar uma nova proposta de estatuto, que veio a ser aprovado em assembléia geral realizada em 21 de julho de 1989. Foi um estatuto avançado, discutido com a categoria e dentro de novos princípios do sindicalismo, como a liberdade e a autonomia. Garantiu-se a extensão territorial do Sindipetro-CE para todo o Estado (antes era só Fortaleza); definiram-se as instâncias de participação da categoria na entidade; ampliou-se o número de diretores, já que a base tinha crescido; o Congresso passou a ser ele mesmo uma instância; e foi criado um Conselho de Representantes Sindicais, de caráter consultivo.

Os conflitos partidários ficam bem evidentes no Sindipetro-CE quando das disputas entre o MOP e a direção. Em setembro de 1989, Aloísio Arruda seria escolhido como o terceiro presidente do Sindipetro-CE, numa chapa consensual. Ele ficaria à frente do Sindipetro entre setembro de 89 e fevereiro de 93. “Nós tínhamos um grupo de discussão – chamado Unidade Petroleira – que se reunia há um ano, aberto a toda categoria, preparando um grupo de pessoas não só para assumir o sindicato, mas para amparar uma futura gestão”, explica Aloísio. “Convidamos o MOP para formar uma chapa única, adotando nosso slogan”, arremata.

As eleições foram vencidas por uma chapa única, Unidade Petroleira, após a modificação do estatuto, mantendo-se para aquele pleito apenas a antiga data da eleição – setembro/outubro – que foi modificada, para as futuras eleições, por conta da coincidência coma data-base. O grupo eleito foi gerado a partir de muitas reuniões e discussões. Com apenas um ano de mandato, porém, ocorreram várias dificuldades. Os ânimos entre os dois grupos políticos se exaltaram e a unidade não foi à frente. Parte da direção, ligada ao PT, praticamente abriu mão de sua atuação, em 1990. Foi um momento desgastante, mas extremamente importante pela compreensão que a categoria tem hoje da necessidade da unidade dos trabalhadores como o instrumento fundamental para o fortalecimento do sindicato, respeitando-se princípios éticos de convivência numa diversidade de pensamentos existentes na categoria.

O Sindipetro-CE passou por um processo de transformação, consolidando-se como uma entidade de referência do movimento sindical no Ceará. Implementou o Projeto Sindicultural, ampliando o leque de atividades, fugindo da mesmice economicista. O Sindicato lançou e editou livros e cartilhas; fundou a Biblioteca, com aproximadamente mil volumes; realizou cursos sobre assuntos específicos; promoveu dois festivais de música (1992 e 1993) no Teatro José de Alencar, destinado aos compositores e intérpretes petroleiros. A arte dos cearenses foi trazida para a luta.

O Projeto Sindicultural – questionado pela oposição – nasceu de uma idéia de Rejane Reinaldo e Jamaci Araújo – à época assessoras de formação do Sindipetro-CE – e Zezé Fonteles – cantora e compositora cearense. O Projeto deu uma nova vida para o movimento sindical. Outros sindicatos viram o trabalho e começaram a perceber que não bastava trabalhar apenas índices econômicos. O Sindipetro-CE assumiu uma posição de destaque no sindicalismo cearense, a partir de uma nova linha de atuação. Palestrantes de nível nacional foram trazidos para discutir Qualidade Total até dentro do auditório da Petrobras. Isso possibilitou uma maior participação da categoria, ao mesmo tempo em que diminuiu o corporativismo. Para ter uma idéia, os petroleiros não tinham a prática dos atos em frente às unidades e não aceitavam a participação de pessoas de outras categorias em suas manifestações.
Nessa gestão, ocorreu a filiação à Central Única dos Trabalhadores (CUT), já caracterizada pelo respeito à pluralidade do pensamento classista dos trabalhadores, com uma visão de luta contra os propósitos opressores do sistema capitalista, e com um grande espaço para discutirmos os rumos da organização sindical dos trabalhadores no Brasil. Hoje, dos 19 Sindipetros, 17 são cutistas, um não é filiado mas tem diretoria ligada à CUT e apenas um é contrário à idéia de filiação à entidade.

Para avaliar a efervescência do movimento à época, de 1988 a 1994 foram realizadas oito greves, todas nacionais, dirigidas pelo sindicato, variando de três até 24 dias de duração. Os problemas e procedimentos a serem tomados durante as greves foram ficando mais complicados: quem corta primeiro o quê? Por exemplo, os de terra cortam o recebimento de gás ou os do mar cortam seu envio? Em 1989/1990, no Rio de Janeiro, os Sindipetros promoveram um seminário tentando estabelecer parâmetros técnicos para resolver essa situação, mas nada ficou resolvido.

Em março de 90, os petroleiros puxaram a primeira greve do governo Collor. A organização demonstrada naquele momento foi muito forte, após a experiência de 88. A empresa desembarcou as lideranças do movimento. Desta forma, os trabalhadores tiveram, por exemplo que embarcar num dia e desembarcar na mesma data. Era a época das demissões do Governo Collor. Conseguiu-se fechar o acordo em relação ao efetivo mínimo com o Nuproce. Novamente, dirigentes sindicais embarcaram para coordenar o efetivo mínimo. O acordo porém não iria adiante. Os trabalhadores embarcaram numa quarta e foram obrigados a desembarcar na quinta. Os off-shores discutiram por mais de sete horas em cadeia de rádio sobre a quebra de acordo pela empresa. A tensão era enorme. As pessoas choravam e se emocionavam. Nesta assembléia, decidiu-se por abandonar as plataformas. “Um botão desligava os equipamentos. Fui fechá-lo e um companheiro pegou um cabo de vassoura e o fechamento da PAT-03 foi coletivo”, recorda Charles Nobre, então primeiro-secretário do Sindicato. As demissões só foram revertidas depois que os dirigentes sindicais resolveram ocupar a sede da Petrobras (RJ), em dezembro de 92.

Em 16 de janeiro de 91, foi lançado o Comitê Estadual em Defesa do Sistema Petrobras, no Auditório Castelo Branco, da UFC. Naquele momento, Ivonete Maia (então Presidenta da Associação Cearense de Imprensa – ACI) deu a notícia da invasão de Bagdá pelos EUA. A partir de então, o Sindipetro passou a ter maior visibilidade na mídia e dentro da própria CUT, mesmo contando apenas com dois diretores liberados. O Comitê em Defesa da Petrobras intensificou a ação junto aos parlamentares, partidos políticos e às organizações da sociedade civil, com várias atividades.

Em setembro de 91 realizou-se outra greve, de 24 dias, junto com os bancários, enfrentando o julgamento da abusividade pelo TST. O lema impresso em todos os materiais era “abusivo é o TST, num momento de intensa participação da categoria – nas ruas e nas praças”. Os petroleiros eram poucos, porém ousados. As limitações econômicas da entidade não frearam a disposição de luta. A prova de fogo: peitar o devastador Governo Collor, com suas investidas neoliberais (arrocho salarial, demissões, privatização e aniquilamento do movimento sindical). A Revisão Constitucional iniciada por Collor e levada à frente por Itamar Franco foi derrotada pela força do movimento.

Já em 92, foram feitas várias paralisações parciais. No dia do impeachment de Collor, os petroleiros pararam meio-expediente e foram de ônibus fretado para a praça do Ferreira, para junto com outros trabalhadores acompanhar a votação pelo painel instalado pela CUT.
A greve de maio de 1995

O debate político na categoria não parava de crescer. A divergência que havia ficado clara na primeira gestão de Aloísio Arruda e a cisão entre PCdoB e PT gerou o primeiro e acirrado embate entre duas chapas numa eleição para o Sindipetro-CE. A chapa Com todo o gás, ligada ao PCdoB venceu (55% dos votos), com o apoio da CUT Estadual, por uma pequena margem, a chapa Trabalho de Base, que tinha o apoio da CUT Nacional, próxima ao PT (45% dos votos). A liderança que os petistas tinham entre os off-shores não foi suficiente para suplantar a maioria dos comunistas entre os aposentados, cujos votos foram decisivos para decidir a eleição.
Em 1993, Charles Nobre foi eleito presidente do Sindipetro-CE. Ele iria gerenciar a entidade no período mais crítico de sua história: a greve de maio de 1995. O novo presidente, Fernando Henrique Cardoso, havia acabado de suceder Itamar Franco, que havia assumido a vaga de Collor após o impeachment. FHC consolidou o neoliberalismo no país, enxugou o Estado, demitiu servidores e privatizou e quebrou o monopólio das estatais.

A greve foi um marco no movimento sindical. Durou 31 dias, de 3 de março a 4 de abril de 1995. No dia 9 de março, o TST julgou a greve abusiva. Os trabalhadores não se renderam e continuaram o movimento. FHC manda o Exército ocupar as refinarias. É montado o Barracão da Resistência, em frente a Asfor, núcleo de aglutinação e de luta da categoria. Os petroleiros queriam 26% de reajuste e saíram apenas com um abono e um reajuste pequenos, muitos pouco ante o desconto dos dias parados e as 71 demissões. Os sindicatos, por sua vez, foram multados em R$ 2,1 milhões cada um.

Só havia um caminho que poderia levar à vitória: a união de todos os trabalhadores brasileiros numa grande greve geral. Infelizmente, isso não aconteceu. Porém, os exemplos de solidariedade dados a nós nesta greve superaram qualquer expectativa. Houve o reconhecimento político da importância daquele momento para o futuro do movimento sindical e popular. Os petroleiros passaram por situações difíceis e – nestas horas – contaram com o apoio das mais diversas entidades e de vários companheiros que contribuíram espontaneamente de maneira individual . Passando a sacolinha, os petroleiros arrecadaram R$ 12.147,31. Além disso, receberam apoio estrutural através de empréstimo de carros de som, doações de chamadas no rádio, cestas básicas, apoio humano, além de várias outras iniciativas.

Em 1995, durante a greve, os trabalhadores notaram que a justiça não é cega coisa nenhuma. A balança sempre pende para o lado do mais forte. Com a subida de FHC ao poder, a submissão da Justiça ao Governo (Executivo) ficou totalmente escancarada. Não só a greve dos petroleiros – que tinham um acordo firmado como ex-presidente da República Itamar Franco – mas todas as greves – principalmente as que envolviam estatais e serviço público – foram julgadas ilegais. No Ceará, à época, os trabalhadores da construção civil e da saúde também foram considerados foras-da-lei. Quem não se lembra da revogação – na calada da noite – dos enunciados dos Planos Bresser e Verão, que garantiriam o pagamento destes passivos trabalhistas? Aliás, o ex-Governador e ex-Ministro Ciro Gomes já foi intimado pela justiça a pagar os passivos trabalhistas para trabalhadores de diversos órgãos estaduais – como o BEC, por exemplo – e nunca pagou. Ou pior, declarou publicamente que não ia pagar. E ficou por isso mesmo.
Enquanto os petroleiros eram tratados como marginais, a bancada ruralista era dispensada do pagamento de 50% dos juros dos empréstimos feitos ao Banco do Brasil, causando prejuízo de um bilhão de reais aos cofres da Nação. O governo FHC comprava votos no Congresso para fazer passar suas propostas na reforma constitucional, usava dinheiro do Fundo Social de Emergência para comprar goiabada cascão e nada acontecia. Finalmente: a mesma justiça que afirmou que todo aumento acima do permitido por lei era ilegal, reajustou, à época, os salários de seus próprios ministros em 45%.

Os petroleiros tiveram dois acordos firmados com o governo e descumpridos, um deles como aval do ex-presidente Itamar Franco. Antes de setembro de 94, acumulavam perdas equivalentes a 108%. Desde setembro, acumulam uma perda salarial de 26,6%. Apesar de o Governo e a direção da Petrobras fecharem acordos e não cumprirem, só os trabalhadores foram responsabilizados. Os deputados e senadores tiveram reajuste de 148% e FHC deu aumento de 155% para seus ministros e de 220% para si próprio. No mesmo período, deu para os trabalhadores das estatais e do serviço público míseros 13%, numa época em que a inflação preenchia duas casas decimais todos os meses.

O TST se desmoralizou, ao julgar sempre a greve abusiva, num claro atrelamento às normas do Executivo. Os trabalhadores foram constantemente ameaçados de demissão quando exercem o direito legítimo e constitucional de, como cidadãos, emitir opiniões e defender o monopólio estatal do petróleo. Mesmo como fim da greve, a justiça determinou o fim do repasse da contribuição sindical para os sindicatos e a cobrança de multa de R$ 2.100.000,00 para cada sindicato. O Sindipetro ficou três anos com seus recursos bloqueados, com a Petrobras depositando a contribuição em juízo. Os bens da entidade foram penhorados. A investida de FHC – como os trabalhadores já sabiam – não foi contra uma greve, e sim contra o sindicalismo brasileiro. O movimento sindical petroleiro ficou ameaçado de extinção pura e simples. E este tipo de arbitrariedade, fundamentada na Lei veio a ser aplicada em todas as greves dos demais sindicatos.

A imprensa, principalmente a Rede Globo, por várias vezes colocou no ar matérias distorcidas e mentirosas tentando colocar a sociedade contra os trabalhadores. No Ceará, a principal mentira era a que diz que ia faltar gás de cozinha. O povo não sabia que 95% do gás distribuído no Estado é importado. Não havia o menor risco de desabastecimento. O ex-ministro Ciro Gomes mentiu descaradamente em artigo publicado nas páginas do jornal O POVO do dia 28 de maio. Ciro falou que não houve acordo entre o ex-presidente e os petroleiros. Ora, o primeiro a desmentir Ciro Gomes foi o próprio, quando fez questão de declarar publicamente que fechou o acordo com a categoria. O próprio TST, ao julgar pela segunda vez a greve abusiva, reconheceu que houve o acordo, e que ele era eticamente correto, embora sem validade legal.

O duro tratamento dispensado aos grevistas pelo governo foi vergonhoso e irresponsável . A intervenção militar nas refinarias, além de ser uma ação dos tempos da ditadura, tornou-as verdadeiros barris de pólvora. Na troca de guarda, era necessário carregar o armamento. Caso houvesse algum disparo acidental, um incêndio comprometeria não só todo o complexo da refinaria, mas as áreas vizinhas. À época, a FUP e o Sindipetro-CE responsabilizaram o presidente da República por quaisquer danos causados a estas comunidades.

Era FHC: retração no movimento sindical

Os resultados da greve foram desastrosos não só para os petroleiros, mas para todo o movimento sindical brasileiro. Afinal, se a categoria mais combativa do país não havia tido sucesso depois de uma greve de 30 dias, que categoria poderia enfrentar FHC? Foi um período de violenta retração no movimento sindical. A ordem era manter as conquistas.

Em julho de 1995, foi quebrado o monopólio da Petrobras na Constituição. Na empresa, a reestruturação produtiva reduziu drasticamente o quadro de trabalhadores. No período da greve de maio de 1995, havia 420 off-shores. No final do governo FHC, tem-se apenas 80. Na Fazenda Belém, em Aracati, dos 80 petroleiros existentes sobraram apenas 20. Além da reestruturação, houve os Planos de Demissão Voluntária Incentivada (PDVIs), incentivos à aposentadoria e aumento dos terceirizados. Em nível geral, a Petrobrás saiu de 60 mil trabalhadores, em 1990, para 34 mil. A empresa terceirizou também áreas estratégicas – como manutenção, por exemplo – o que gerou uma queda na qualidade dos serviços desempenhados, por conta da alta rotatividade, precarização das condições de trabalho e péssima remuneração dos trabalhadores. Mesmo assim, o Sindipetro-CE continuou na luta. Em todos esses anos, não deixou de realizar seu Congresso Estadual e nem de participar dos eventos da FUP e da CUT.

Em 1996, novamente Charles Nobre foi eleito presidente, empossado dia 1º de maio, numa chapa de unidade, que tratou de administrar a crise financeira, criando um momento de união da categoria em meio às dificuldades enfrentadas, racionalizando também problemas políticos internos.

Nesse ínterim, aumentaram os casos de acidentes de trabalho, por conta da redução do efetivo e do descaso da empresa. Em 1997, só em janeiro, 18 mil litros de óleo são derramados em Fazenda Belém. Em abril, ocorrem três rompimentos de tubulação – dois na PCR-01 e um na PAT-03. Em 21 de maio, o poço XA-21 arrebenta gaxetas e hastes em poço da PXA-02. Em 13 de março de 1998 morre Cleiton Higino do Amaral Pereira, 37, em acidente em Fazenda Belém. Ele foi a segunda vítima da Petrobras, após o falecimento de José Cosme dos Santos, 44, em Icapuí. Em abril, novo vazamento em Fazenda Belém, com derrama de 15 mil litros de óleo. No dia 21 de julho de 1998, houve incêndio na cozinha da PCR-1. O Sindipetro-CE provoca a visita da DRT às plataformas com denúncias de falta de segurança, alimentação e higiene inadequadas.

No dia 24 de abril é lançado o livro SAÚDE MENTAL E TRABALHO EM PETROLEIRO DE PLATAFORMA – Penosidade, rebeldia e conformismo em petroleiros de produção (on shore/off shore) no Ceará, do médico psiquiatra José Jackson Coelho Sampaio, atual reitor da Universidade Estadual do Ceará

1997 fica marcado pela luta contra a implantação do Regime Administrativo de Campo (RAC), que reduzia, além da remuneração, a folga do trabalhador e seus postos de trabalho. A Procuradoria Regional do Trabalho reconheceu a ilegalidade do RAC e pediu sua suspensão até 30 de abril de 1998. O julgamento, ocorrido em maio de 1998, na 5ª Junta de Conciliação e Julgamento da Justiça do Trabalho, em Natal, foi contrário aos interesses dos trabalhadores. O Sindipetro-CE recorreu da decisão.

Além disso, houve a edição da lei nº 9.478, em agosto de 1997, que substituiu a lei nº 2.004/53 e regulamentou a quebra do monopólio da Petrobrás. Naquele ano houve também a privatização da telefonia e da energia nacionais. Mesmo assim, durante anos, os petroleiros conseguiram – via FUP – fechar acordos com reajustes, sempre levados “com a barriga” pela direção da Petrobrás, menos em 1998. Naquele ano, a luta foi contra a Reforma da Previdência, mais uma iniciativa de FHC contra os trabalhadores.
A execução de uma política neoliberal no Governo FHC, imposta pelas estruturas hegemônicas internacionais, levaram à abertura da exploração e explotação das jazidas e demais setores ulteriores da cadeia produtiva do setor petróleo a empresas internacionais. Neste processo, a partir de 1997, desmontou-se abruptamente o planejamento empreendido pelo Estado brasileiro no setor petróleo, que era executado pela Petrobras, sem que os novos atores apresentassem resultados próximos dos objetivos propugnados.
Novos tempos, novas lutas

Em 1999, outra chapa consensual assumia os destinos do Sindipetro-CE. O mandato de três anos foi dividido igualmente entre dois presidentes de dois grupos políticos diferentes: Wanderley Antunes (março de 1999 a outubro de 2000) e Aloísio Arruda (setembro de 2000 a fevereiro de 2002).

O período caracterizou-se pela perda de direitos dos novos contratados em relação aos antigos trabalhadores, além de um tratamento mais duro em relação aos aposentados. Além disso, o Sindipetro-CE participou ativamente das atividades da caravana contra as privatizações, em dezenas de cidades cearenses. Em 8 de junho de 1999, aos 91 anos, faleceu um dos maiores defensores do petróleo brasileiro: o tenete-aviador, jornalista e escritor cearense Jocelyn Brasil. O Sindipetro-CE participa da da Marcha a Brasília, dia 26 de agosto, contra as privatizações e pregando o “fora FHC!”.

Os desvios de função influíram também na ocorrência dos acidentes na empresa. Em 15 de março, na PXA-2, a cesta do guindaste que transportava quatro empregados chocou-se contra a embarcação. Em 12 de abril, novo acidente, na PXA-1, pára a produção de petróleo e gás natural no Ceará. Em 21 de maio, um eletricista fratura duas costelas ao dar manutenção num gerador em Fazenda Belém. Em 27 de julho, acidente no NUPROCE fraturou a perna quando do transporte para rendição.

Dias 27 e 28 de outubro de 1999, a categoria tem força para fazer mobilizações e exigir nova contraproposta de Acordo Coletivo da Petrobrás na Campanha salarial 1999/2000. Finalmente, após a prorrogação do Acordo Coletivo de Trabalho de 1998, sai um novo Acordo para 2000.

Os acidentes continuam acontecendo nas plataformas, em janeiro de fevereiro daquele ano, na PEP-1, PCR-1 e LUBNOR. A PEP-1 teria novo acidente em maio de 2000. Em junho e julho, novos acidentes: incêndio e vazamento na PXA-1.

A categoria novamente mostrou sua determinação política ao não aceitar a ridícula proposta de mudança do nome da empresa Petrobras para Petrobrax, o que ia contra a tradição de uma das mais tradicionais empresas brasileiras.

O Governo FHC, que estimula o desmonte das estatais brasileiras, para depois privatizá-las, é responsável pelo sucateamento da Petrobras, reduzindo o orçamento da estatal a cada ano. Além disso, a política de FHC promove a redução de pessoal – a Petrobras cortou metade de seu efetivo nos últimos dez anos. Sem trabalhadores suficientes para operar as unidades da empresa, fica muito mais difícil a detecção imediata e o combate eficiente aos acidentes. Quando se investigam as causas desses acidentes, há sempre fatores em comum: falta de manutenção de equipamentos, falta de pessoal para detectar e controlar as emergências, terceirização. A atual política gerencial da empresa só privilegia o aumento da produção e o corte de custos, em detrimento da segurança dos trabalhadores e, como conseqüência, das comunidades vizinhas e do meio ambiente. E quando os acidentes ocorrem, a direção da Petrobras sempre impede a participação dos sindicatos nas investigações, numa atitude típica de quem tem medo de revelar a verdade. Se as falhas de segurança fossem discutidas de forma transparente, a empresa seria obrigada a saná-las, evitando novas tragédias.

Período Lula: reconquista de benefícios e incertezas

Em janeiro de 2002 assumiu a presidência do Sindipetro-CE Orismar Holanda Gomes. A posse, dia 1º de março, foi marcada com uma emocionante homenagem aos ex-diretores da entidade, no Clube dos Empregados da Petrobras.

É também em janeiro do mesmo ano que o Brasil recebe seu novo presidente, Luís Inácio Lula da Silva, eleito com o maior número de votos já direcionados a um candidato na história da democracia mundial. O governo mostra-se continuista da gestão FHC e, por isso, deixa os trabalhadores numa situação difícil em que não sabem se levam em conta a luta histórica ou a luta imediata. De todo modo, só nos dois primeiros anos de governo Lula já foi possível reconquistar todas as perdas trabalhistas do governo anterior.

Orismar Holanda permanece presidente do Sindipetro Ceará até 2013, nesse período, entre outras conquistas, o Sindipetro Ceará extende sua base para o Piauí, tornando-se Sindipetro CE/PI.

Em quarto mandato, disputando chapa para o quinto mandato, Orismar, que encabeçou a chapa 1 do sindicato, acabou perdendo a eleição para a chapa 2 – Transparência e Ação, cujo candidato a presidente foi Oriá Fernandes, antigo diretor Jurídico da Entidade (em 2008).

Na noite do dia 28/02 a nova diretoria tomou posse do Sindipetro CE/PI às 18h. Estavam presentes membros da chapa vitoriosa – transparência e ação e outros convidados, que prometeu reanimar o sindicato e estar mais presente nas bases, mas que pegou uma turbulência política em meio a uma crise mundial e um dos piores momentos para a Petrobrás, com a queda brusca do preço do Barril (chegando a 40 Dólares) e privatizações fatiadas promovida pelo governo da sucessora de Lula, presidenta Dilma Rousself, a primeira mulher a assumir a presidência do País, que aliada a políticos ligados ao PMDB e setores mais conservadores da sociedade, a tirou da presidência do Brasil, gerando uma grave crise política.