Secretário de Administração e Finanças da CUT defende que o trabalhador pague menos imposto, que o rico pague mais para que a economia cresça e ao mesmo tempo haja justiça social

 Publicado: 13 Maio, 2024 – 10h58 | Última modificação: 13 Maio, 2024 – 11h15

Escrito por: Rosely Rocha

 ROBERTO PARIZOTTI (SAPÃO)
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O Brasil tem uma intricada rede de impostos federais, estaduais e municipais fazendo com que o país seja um dos que mais cobram tributos. Ainda assim, as contas governamentais não registram arrecadação suficiente para todas as necessidades da população, carente de políticas públicas, apesar de diversos benefícios como o Sistema Único de Saúde e o Bolsa Família, para citar apenas alguns.

Embora se reconheça a necessidade de arrecadação, o país precisa rever a sua política tributária que hoje penaliza mais os trabalhadores que ganham a partir de dois salários mínimos (R$ 2.824), enquanto o 1% da população mais rica paga bem menos. Atualmente a maior parte da renda dos mais ricos vem de lucros e dividendos de suas empresas e negócios, uma renda isenta de imposto. Enquanto um trabalhador que ganha acima de dois mínimos é obrigado a pagar o tributo, um grande empresário, banqueiro ou investidor que recebem fortunas em lucros e dividendos possui inúmeras formas de até não pagar nada sobre tais valores.

Dados da Receita Federal do ano passando mostram o 1% mais rico possui fortuna média de R$ 4,6 milhões. Outra fatia desse segmento, 0,1% dos brasileiros, possui R$ 26,2 milhões. E, outra parte, 0,01% dos brasileiros mais ricos possui fortuna média R$ 151,5 milhões.

Diante desse abismo tributário é que a CUT vem defendendo que o trabalhador pague menos imposto e o rico pague mais. O secretário de Administração e Finanças da CUT Nacional, Ariovaldo de Camargo, analisa por que essa pauta é tão importante para os trabalhadores e as trabalhadoras.

ROBERTO PARIZOTTI (SAPÃO)Roberto Parizotti (Sapão)
Ariovaldo de Camargo-Secretário de Adm e Finanças da CUT Nacional

Por quê corrigir a tabela do IR é considerada pela CUT, justiça social?

Ariovaldo de Camargo – Quando você fala da correção da tabela do Imposto de Renda, significa fazer com que aqueles que são assalariados, que recebem pouco mais de dois mínimos, deixem de pagar. Quando o presidente Lula diz que quem ganha até R$ 5 mil vai ser isento de imposto de renda até o final do mandato dele, significa que esse número não é superior a 15% da população brasileira. Só para que se possa compreender um pouco mais, está se esperando que tenham quase 43 milhões de declarações de imposto de renda em 2024, um conjunto de pessoas que paga tributos e declara imposto de renda, sendo que parcela dela, inclusive, tem devolução. E nós estamos falando, portanto, de um conjunto muito grande de trabalhadores que vai poder consumir mais, já que se a isenção fosse R$ 5 mil a maioria desse 43 milhões não pagaria mais o IR. São trabalhadores que vão poder, através dessa isenção, colocar mais dinheiro, inclusive, no mercado, o que vai gerar mais emprego, que vai gerar melhores condições para os trabalhadores que ganham baixos salários, numa perspectiva da aquisição de bens.

Como então pagar a conta com menos arrecadação direta, como é o caso de desconto na folha?

Ariovaldo de Camargo – O trabalhador tendo mais dinheiro na mão faz a economia crescer com um pouco mais de velocidade, o que certamente não tem nenhum segredo, certo? No caso dele pagar menos imposto de renda, significa que alguém vai ter que pagar essa conta. E a reforma tributária está apontando na direção de buscar taxar quem tem altos investimentos, taxar as grandes riquezas, as herança milionárias e aqueles que vivem somente de renda, o que de certa forma, deve ser o papel, inclusive, da própria tabela de imposto de renda, que é tributar os super-ricos e não tributar o assalariados como o que acontece no Brasil há muito tempo.

O que é preciso para se fazer uma reforma tributária que taxe os ricos e não os pobres?

Na verdade, estamos convencidos, é o Parlamento brasileiro, embora tenha a maioria de seus representantes ligados aos setores de latifundiários, de grandes empresas e tudo mais que precisa tomar uma atitude, desafogando financeiramente aqueles que mais precisam, para que a população brasileira possa entender que a tributação precisa ter um impacto que seja, pelo menos, de alguma proporcionalidade, de alguma razoabilidade.

Hoje, o trabalhador paga muito imposto no consumo e paga imposto, inclusive, na sua própria renda como é o caso do assalariado. Nós achamos que o trabalhador tem que ter a garantia de que os seus salários não sejam corroídos pela alta taxa do imposto sobre salários que nós temos no Brasil, enquanto os super-ricos quase nada pagam de tributos.

Quais pontos da reforma tributária que você entende ser importantes para os trabalhadores?

Ariovaldo de Camargo – Já há por parte do governo Lula algumas propostas positivas como a isenção de impostos de alguns produtos da cesta básica, de produtos de primeira necessidade, de medicamentos e a mais importante para nós que é a isenção na tabela de impostos para quem ganha até R$ 5.000,00. Então, isso faz com que esse andar da pirâmide econômica do Brasil, que estão mais na base, possa ter um alívio nesse momento. Ou seja, nós precisamos trabalhar os tributos do Brasil como sendo algo necessário, porque exatamente o Estado não vive sem tributos, portanto, o governo precisa arrecadar. Agora, a arrecadação não pode ser sempre sobre quem está na base da pirâmide, tem que arrecadar mais de quem está na ponta da pirâmide, os super-ricos, esse é o impacto que precisa ser feito.

Isso, inclusive foi uma das bandeiras da campanha do presidente Lula

Ariovaldo de Camargo – Sim, o papel, inclusive do governo democrático popular, que se elegeu com a alta maioria dos trabalhadores das classes C, D e E é o de dar essa resposta para a sociedade. Foram os trabalhadores que escolheram esse tipo de governo, e não o governo como nós tínhamos anteriormente, que tinha um olhar apenas para a “casa grande”. Nós estamos vivendo um outro momento da história e precisamos exigir que o governo cumpra a sua promessa de campanha e, que se coloque à disposição da população.

Se por um lado o Brasil tem uma das cobranças de imposto mais altos do mundo também há uma sonegação muito alta. Como equilibrar essa conta?

Ariovaldo de Camargo – Na verdade, os instrumentos que foram criados nos últimos anos, em especial no governo do presidente Lula, detectou muito essa questão da sonegação. Não é qualquer coisa que foi implementado nos últimos anos no sentido de cruzamento de dados e tudo mais para combater a sonegação. Hoje, na verdade, o problema não está somente na sonegação. O problema está em não recolher os impostos, acumular dívidas milionárias e às vezes até com o Estado e depois acabar em determinados momentos tendo a anistia desses pagamentos ou protelando isso na Justiça por anos e anos e não pagando.

Como, por exemplo?

Ariovaldo de Camargo – Não é qualquer coisa que se sonega no Brasil de ICMS [Imposto sobre Circulação de Mercadorias], por exemplo, e a arrecadação de ICMS é uma responsabilidade dos estados e os maiores sonegadores são os grandes empresários. Basta lembrar o que nós acompanhamos pela imprensa recentemente de qual era o tamanho da dívida  do SBT, da TV Globo, dos grandes clubes de futebol do Brasil, o que a Havan devia de impostos. Ou seja, nós temos o problema, que obviamente não dá para dizer que não há sonegação, ela também existe, mas o que nós temos muito hoje é a falta do pagamento dos tributos, que já estão, portanto apresentados e as empresas acabam agindo de má fé e ainda recorrem para obterem perdão do valor da dívida.

Essa é na minha opinião um dos principais problemas que nós temos hoje, porque é dívida perdoada é de um dinheiro que poderia estar salvando vidas, indo para a saúde, para a educação e outras políticas públicas, etc. É uma série de instrumentos que estão utilizados pelos grandes empresários, e muita gente fica com a visão de quem está perdendo é o Estado, mas quem está perdendo é a população que precisa de médicos, de escola, de segurança pública em condições de poder protegê-la e, inclusive as próprias medidas sociais que o governo tem.

Uma das denúncias da CUT é a de que existe uma sonegação disfarçada, mas de qual forma?

Ariovaldo de Camargo – Por exemplo, o calote que as empresas dão no sistema e até mesmo na própria forma com que nos últimos anos se foi criando instrumentos para permitir que o trabalhador possa estar exercendo o seu trabalho sem fazer sua contribuição previdenciária, como acontece com os trabalhadores em aplicativos e é o que acontece com quase metade da população que está trabalhando sem registro em carteira de trabalho, ou com contratos como pessoas jurídicas. Isso é uma forma de sonegação, de não contribuição que, inclusive, coloca a própria saúde e a previdência pública no Brasil em risco, por falta de arrecadação.

Muito se discute hoje a transição justa, que é a necessidade de se mudar a forma de consumo da sociedade em geral e a CUT defende que o trabalhador não seja quem pague por isso, mas por outro lado, há a necessidade do crescimento econômico. É possível que caminhem juntos?

Ariovaldo de Camargo – Há determinadas questões do ponto de vista de posse que hoje o trabalhador não têm, mas que pode melhorar a sua qualidade de vida no sentido de trocar, por exemplo, quem tem uma geladeira muito antiga por uma mais moderna, o que significa redução do consumo de energia elétrica, que tem a ver inclusive com a questão de transição justa e a diminuição, portanto, do consumo de energia que, inclusive está “afogando” , um pouco o próprio sistema energético brasileiro. Com mais dinheiro, o trabalhador pode substituir os carros mais antigos, que são muito poluidores. Ou seja, nós vamos abrir a possibilidade de que esses trabalhadores melhorem a sua qualidade de vida.

Diante desta situação qual o papel do trabalhador e da trabalhadora?

Ariovaldo de Camargo – O trabalhador precisa reconhecer que ele é o sujeito da história e precisa se apresentar para fazer essas cobranças, como por exemplo, em atividade de mobilização através dos sindicatos, através dos centrais sindicais, numa perspectiva de que ele possa também mostrar que há por parte dos trabalhadores um desejo de que esse país possa dar certo e, para que esse país dê certo é preciso pressão dos trabalhadores sobre os órgãos do governo.