Nos bastidores, Bolsonaro e parlamentares do Centrão articulam a volta da CPFM. Em público ele nega.  Mais uma vez o presidente joga nas costas do pobre e do trabalhador a conta da crise econômica 

 Publicado: 24 Setembro, 2020 – 08h30 | Última modificação: 24 Setembro, 2020 – 09h58

Escrito por: Rosely Rocha

 EDSON RIMONATTO
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A falta de compromisso com a verdade tem sido característica do governo de Jair Bolsonaro (ex-PSL), tanto no debate de questões internas quanto em discursos como o feito esta semana na Assembleia-Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), em que expôs o Brasil e os brasileiros a constrangimentos e riscos de ataques surpresa aos direitos e à renda.

O caso da volta da antiga Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF) é exemplar no que se refere a ataque ao bolso dos trabalhadores e trabalhadoras. Em público, ele nega, mas autoriza sua bancada e seus subordinados e negociar escondido do povo.

Depois de negar diversas vezes durante sua campanha eleitoral e também após ter assumido a Presidência da República, a intenção de criar um novo imposto, Bolsonaro autorizou o seu líder na Câmara, deputado Ricardo Barros (PP/PR) a negociar com os parlamentares do Centrão a viabilidade do Congresso aprovar a CPMF.

A ideia é cobrar 0,2% de todas as transações digitais durante seis anos. Ramos é o intermediário do ministro da Economia, o banqueiro Paulo Guedes, que se afastou das negociações depois de várias brigas com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Na terça-feira (22), o ministro esteve na casa do líder do governo para uma reunião com líderes de partidos governistas para discutir como encaminhar o novo imposto à Casa sem tantas resistências dos parlamentares.

Os R$ 120 bilhões que seriam arrecadados ao ano com o novo imposto são, na verdade, um presente para os empresários que teriam em troca um desconto sobre a folha de pagamentos dos trabalhadores e trabalhadoras com carteira assinada, a chamada desoneração para quem ganha até um salário mínimo (R$ 1.045,00).

Para quem ganha acima deste valor, haveria descontos aos patrões. As empresas que hoje contribuem com 20% sobre a folha salarial para a Previdência passariam a pagar metade disto, 10%. Também se discute uma alíquota menor de contribuição para o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS).

O discurso é de que esta cobrança é “democrática”, já que ricos e pobres pagariam o mesmo valor. O que o governo não diz é que a carga tributária é sempre maior para os mais pobres. O impacto sobre a renda de um trabalhador que ganha R$ 3 mil reais sobre a compra de uma geladeira no valor de R$ 1 mil seria bem maior do que para quem tem rendimento mensal de R$ 50 mil e comprasse o mesmo produto.

O governo foge da discussão que precisa ser feita urgentemente no país sobre  a questão tributária, que passa pelo fim da injustiça social, o que nem de ,longe é o caso da CPMF, e ainda manipula a verdade dizendo que o novo imposto é democrático, critica o secretário de Administração e Finanças da CUT, Ariovaldo de Camargo. O trabalhador mais pobre, que contribui com muito na hora de pagar impostos, não pode continuar pagando a conta da crise econômica enquanto os mais ricos contribuem com muito pouco, complementa.

“Uma reforma tributária teria de promover a equidade entre ricos e pobres. O governo ao invés de taxas as grandes fortunas, as rendas de grandes investidores e as heranças, como defendem a CUT e economistas progressistas, cria na verdade mais um remendo com a CPMF e não ataca os pontos principais da desigualdade social”, afirma Ariovaldo Camargo. 

De acordo com o dirigente, a CUT é a favor da realização de um debate sobre reforma tributária desde que não haja um aumento da carga com a velha lógica que agrada somente banqueiros e patrões e onera os trabalhadores.

“O Brasil precisar ter um olhar diferente sobre a tributação porque a pandemia acentuou ainda mais as diferenças sociais. Os ricos ficaram mais ricos nesta crise, enquanto a população pobre sofre muito mais com dificuldade de subsistência com um auxílio emergencial de 600 reais que vai ainda cair pela metade”, conclui Ariovaldo. 

Para economistas, trabalhadores pagam a conta da nova CPMF

E exemplos de prejuízo aos trabalhadores não faltam. Em entrevista ao Portal CUT, o diretor-técnico do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), Fausto Augusto Júnior, disse que programas sociais serão penalizados com a desoneração da folha de pagamentos, que a nova CPMF vai financiar.  

“Os encargos da folha de pagamentos financiam um conjunto importante de políticas públicas como a casa própria com o FGTS, a Previdência e a política de qualificação profissional”, declarou Fausto, à época dos primeiros balões de ensaio do governo para testar a reação da população à criação de um novo imposto.

Também em entrevista ao Portal CUT, os professores de economia Dari Krein (Cesit/Unicamp) e Leda Paulani (USP), afirmaram que a criação do novo imposto vai retirar ainda mais direitos sociais.  Na avaliação dos economistas, por ser este governo antitrabalhador, a conta das benesses bilionárias  aos patrões e dos R$ 300,00 que podem ser dados aos mais pobres com o Renda Brasil, ficará a cargo de milhões de trabalhadores que perderão renda salarial e direitos. 

Leda Paulini afirmou que “Guedes era um crítico raivoso da CPMF, mas agora como o governo está numa sinuca de bico porque todas as normas de finanças públicas estão sendo violadas por conta da pandemia da Covid 19, com a dívida pública crescendo e a crise econômica se aprofundando, ele e Bolsonaro querem manter o Renda Brasil com finalidades eleitoreiras , mas para isso precisam de dinheiro”.

O novo imposto, segundo Krein, também faz parte de um projeto mais amplo de mexer com todo o sistema de financiamento da Seguridade Social e a criação do imposto negativo.

“A lógica perversa do governo sobre o imposto negativo é pagar a Previdência para o trabalhador informal que ganha até R$ 1.000,00, e levar os demais trabalhadores com carteira assinada para o sistema de capitalização, que é o sonho de Guedes”, afirmou o professor do Cesit.

Edição: Marize Muniz